segunda-feira, 21 de abril de 2008

"Estômago" (por Fernanda Cury)

Se você ainda não assistiu ao filme brasileiro-italiano (trata-se de uma co-produção) "Estômago", assista. Trata-se de um roteiro que discute não apenas as relações de poder, em vários segmentos, como também dos relacionamentos afetivos.
O personagem principal é Raimundo Nonato, um sujeito simplório e ingênuo do nordeste, que vem tentar a vida na cidade grande (São Paulo). Como não tem outra opção, é obrigado a trabalhar para Zulmiro, dono de um bar decadente, que o explora a troco de cama e comida. De qualquer maneira, nesse boteco, o "paraíba" tem a oportunidade de aprender a cozinhar e conquista a prostituta gulosa Íria com as suas deliciosas coxinhas.
Mais tarde, o cozinheiro é descoberto por Giovani, dono de um restaurante próximo (Bocaccia), que descobre seus dons e o contrata, ensinando-lhe a arte da culinária e dos vinhos. Através da cozinha, Nonato ganha dignidade, passando a receber salário e a ter carteira assinada, quando decide pedir Íria em casamento.
Uma semana antes do noivado, Nonato descobre que a noiva tinha um caso com seu patrão. Depois de beber uma garrafa inteira de vinho, resolve matá-los, e, mostrando que aprendera bem as lições ministradas pelo chefe, frita e come um pedaço da bunda de sua ex (carne mais nobre).
Na vida nua e crua da cadeia, consegue cavar seu espaço, cozinhando para os companheiros de xadrez. Torna-se uma celebridade local e é intimado por Bujiu ("dono do pedaço") a preparar um banquete para um poderoso presidiário, o "Etc". Aproveita o ensejo para envenenar o "chefe" e tomar seu lugar.
Embora o roteiro não seja assim linear, alterando-se cenas em que o personagem está livre e solto, discute a relação de poder de uma maneira muito bem humorada. As cenas no presídio, embora um pouco nojentas e bem fortes, mostram as relações de poder, em que uns devoram e outros são devorados.
A linguagem dos personagens, recheada de "palavras de baixo calão" e erros de português, é muito divertida. O presídio é retratado de forma irônica, bem-humorada, mas real (corrupção, lei do mais forte, jogos de interesses). A culinária, tratada como verdadeira arte e como instrumento de poder, abre o apetite, embora, algumas vezes, faça-nos prometer que nunca comeremos nada nos botecos do centro da cidade. A atuação dos atores, todos eles ainda desconhecidos, é fantástica.
Por todos esses motivos, trata-se de um filme que vale ser visto, mostrando a trajetória da ingenuidade à malandragem, que foi aprendida com a dureza da via. Está em cartaz tanto no Shopping Frei Caneca, como no Espaço Unibanco.

Nenhum comentário: